Síndrome de Rett
Ficha citações
SCHWARTZMAN, J.S
Rev. Bras. Psiquiatr. v.25 n.2 São Paulo jun. 2003. P.110-113.
Programa de Pós-graduação em Distúrbios do Desenvolvimento da Universidade Presbiteriana Mackenzie. São Paulo, SP, Brasil
"O diagnóstico da SR, até pouco tempo, era exclusivamente clínico, existindo ainda critérios para o diagnóstico de quadros atípicos da SR, que somente devem ser firmados após os 10 anos de idade.” (p.110)
“A doença evolui de forma previsível, em estágios, que foram nomeados por Hagberg & Witt-Engerström (1986) da seguinte forma: o primeiro deles, denominado estagnação precoce, inicia-se entre seis e 18 meses e caracteriza-se por uma parada no desenvolvimento, desaceleração do crescimento do perímetro craniano, diminuição da interação social com conseqüente isolamento. Esse estágio tem a duração de alguns meses. O segundo, rapidamente destrutivo, inicia-se entre um e três anos de idade e tem a duração de semanas ou meses. Uma rápida regressão psicomotora domina o quadro, com a presença de choro imotivado e períodos de extrema irritabilidade, comportamento tipo autista, perda da fala e aparecimento dos movimentos estereotipados das mãos, com subseqüente perda da sua função práxica; disfunções respiratórias (apnéias em vigília, episódios de hiperventilação e outras) e crises convulsivas começam a se manifestar.” (p.110,111)
“Entre os dois e dez anos de idade instala-se o terceiro estágio: o pseudo-estacionário, no qual ocorre certa melhora de alguns dos sinais e sintomas, inclusive do contato social.“ (p.111)
“O quarto estágio, que se inicia por volta dos dez anos de idade, é o da deterioração motora tardia, ocorrendo lenta progressão dos déficits motores, com presença de escoliose e severa deficiência mental. Epilepsia pode se tornar menos importante, e as poucas pacientes que ainda retêm a deambulação gradualmente terão prejuízos crescentes, acabando por ter que utilizar cadeiras de rodas.” (p.111)
“Apesar de ser habitual afirmar-se que as meninas com SR são normais ao nascimento e demonstram um desenvolvimento normal até os seis ou dezoito meses de idade, sabe-se hoje que em grande parte dos casos, senão em todos, há na verdade um atraso no desenvolvimento motor com hipotonia muscular e prejuízo no engatinhar, que são os sinais iniciais.” (p.111)
“A fala está sempre muito comprometida e, muitas vezes, totalmente ausente. Algumas crianças chegam a falar, deixando de fazê-lo à medida que a deterioração avança.“ (p.111)
“Crises epilépticas são de ocorrência comum. Podem assumir várias formas e, eventualmente, demonstrar grande resistência à medicação antiepiléptica habitual. Afirmar a real prevalência de epilepsia nessas pacientes é difícil, porque elas podem apresentar outras manifestações paroxísticas que são, muito freqüentemente, confundidas com epilepsia.” (p.111)
“A sobrevida na SR pode ser limitada, sobrevindo a morte, em geral, em decorrência de um quadro infeccioso ou durante o sono (morte súbita). Outro fator que pode limitar tanto a qualidade de vida como o tempo de sobrevida, consiste nos problemas respiratórios crônicos decorrentes de problemas secundários à escoliose, que pode chegar a comprometer seriamente a expansão pulmonar.” (p.111)
“A grande maioria dos casos de SR é composta de casos isolados dentro de uma família, exceção feita à ocorrência em irmãs gêmeas; porém, casos familiares têm sido observados. Costumava-se considerar a SR como uma desordem dominante ligada ao cromossomo X, em que cada caso representaria uma mutação fresca, com letalidade no sexo masculino. Foram observados casos nos quais meninos, irmãos de meninas com a SR, nasciam com uma doença encefalopática com óbito precoce. Nessa perspectiva, alguns poucos casos foram descritos nos quais um fenótipo similar ao da SR foi observado em meninos. Em geral, constituíam apenas um sugestivo do diagnóstico, com sinais e sintomas presentes de forma bastante atípica e parcial.” (p.112)
“Em 1998, foi descrito um caso de um menino que, na ocasião, tinha dois anos e nove meses de idade, apresentando fenótipo integral da SR na sua forma clássica. Esse menino, apresenta cariótipo XXY, caracterizando, portanto, uma associação das síndromes de Klinefelter com a SR, ocorrência com uma probabilidade da ordem de uma para dez a 15 milhões de nascimentos.” (p.112)
“Apenas um ano após, em 1999, foram descritas pela primeira vez mutações no gene MeCP2 em pacientes com a SR. Interessante que após a descrição dessas mutações do MECP2, foi realizada a pesquisa para esse marcador no menino anteriormente referido, no qual havia sido descrita a associação do fenótipo Rett e XXY. Foi encontrada uma mutação nesse gene, confirmando tratar-se, realmente, da SR. Estudos mais recentes indicam que cerca de 75% a 80% de pacientes com a forma clássica da SR têm mutações no gene MECP2. Considera-se que a proteína MeCP2, produzida pelo gene, funciona como repressor global de transcrição. Como essa proteína possui alguns diferentes sítios de ação, acredita-se que as diferentes mutações encontradas no gene seriam responsáveis pelos diferentes fenótipos observados nos portadores de SR. Sabemos, hoje, que alguns meninos portadores das mesmas mutações podem sobreviver, apresentando um quadro encefalopático totalmente distinto do quadro clínico clássico da SR no sexo feminino.” (p.112)
“Do ponto de vista neuropatológico, é fato a desaceleração do crescimento craniano que ocorre a partir do terceiro mês. O lobo frontal, o núcleo caudado e o mesencéfalo são as regiões encefálicas nas quais foram observadas as maiores reduções. Começam a surgir evidências de que a SR poderia estar relacionada a uma deficiência pós-natal no desenvolvimento das sinapses; mas restaria, ainda, conhecer o defeito básico presente.” (p.112)
“Dependendo da fase em que se encontra a SR, várias condições deverão ser levadas em consideração entre os diagnósticos diferenciais: patologias fixas, como a paralisia cerebral e outras encefalopatias fixas; síndrome de Angelman; autismo infantil; e várias doenças metabólicas.” (p.112)
“A síndrome de Rett é uma das causas mais freqüentes de deficiência múltipla severa no sexo feminino. Pelo conjunto de suas características, trata-se de quadro que deve interessar todos os profissionais da área da saúde, especialmente pediatras, para o encaminhamento e diagnóstico precoce, e especialistas que atendam pessoas com distúrbios neuropsiquiátricos severos.” (p.112)
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